Cinco meses já se passaram desde que Henrique Bredda conversou com o E-Investidor, em uma das primeiras entrevistas publicadas no portal. De lá para cá, com o desenrolar da pandemia de covid-19, o mercado financeiro e as ações foi até o purgatório e voltou – sem poupar os fundos administrados por sua gestora, a Alaska, que chegaram a ter perdas de quase 70%, assustando muitos cotistas.
Mesmo nos momentos de maior volatilidade, porém, Bredda não esmoreceu e procurou passar calma aos investidores, confiante de que o jogo voltaria a virar no longo prazo. “Não sei como 2020 terminará, mas sigo confiante para os próximos cinco ou dez anos”, escreveu em uma de suas redes sociais.
Por falar em redes sociais, suas postagens, que misturam investimentos, educação financeira e até opiniões provocativas sobre política e outros assuntos, atraem a atenção de centenas de milhares de seguidores. “Não sou guru de ninguém”, avisa ele.
Confira a entrevista a seguir:
Em suas redes sociais, você dá vários recados para o investidor iniciante que sofre com a queda da ação, ou aquele que sai do fundo na primeira perda. Hoje, o investidor mais conservador está sendo forçado a entrar numa zona de risco a que não está acostumado. Que conselhos você dá para esse cara que vai levar muito susto
Henrique Bredda – A migração de uma modalidade de pouquíssimo risco para a renda variável deveria ser encarada pelo investidor como algo muito importante na vida dele. Como ocorre quando ele está prestes a casar, ter filhos ou adquirir um imóvel. Ele pondera muito: antes de fechar negócio, visita vários imóveis, compara preços, analisa as regiões, vê o valor da parcela de financiamento que cabe no bolso e pesquisa bancos diferentes. Gasta um bom tempo nisso, discute com a família e então toma uma decisão.
Com renda variável, seja por meio de fundos ou comprando uma carteira de ações, é a mesma coisa. Se vai comprar ações, estude a empresa, o que ela faz, quem é o dono, examine os balanços e o patrimônio. Se você não tem condições de entender essas informações, que são o básico da contabilidade, então não invista. Tente primeiro entender isso, mas não siga dicas de outras pessoas.
No caso de fundos, veja quem é a gestora, quem são os sócios e qual é o objetivo daquele fundo. Se ele busca ganhar dinheiro em 5 ou 10 anos e você quer ganhar dinheiro em um ano, não invista nele. Gaste tempo estudando o movimento que quer fazer. Não aja por impulso. Se você migrar da renda fixa para a variável só porque o CDI caiu, quando a renda variável cair 30% você vai ficar apavorado e sair. Para não cair nessas ciladas normais de todo iniciante, não decida por impulso: estude.
Seu discurso prega que se tenha um horizonte mais longo para investir, para ter uma percepção de valor correta dos ativos e colher bons resultados. O investimento de curto prazo morreu?
Depende. Tem gente que é boa em decisões de curto prazo. Mas investir em renda variável com cabeça de curto prazo, isso eu não sei fazer e desconheço exemplos de gente que vai bem por esse caminho. A natureza do investimento em empresas é de longo prazo.
Para o curto prazo, é possível investir no CDI, em renda fixa com dívidas de empresas e aplicações menos arriscadas. Tudo isso pode crescer porque hoje há uma gama enorme de possibilidades. Tudo que for além do mais básico, que é poupança e CDB de banco, vai crescer muito no Brasil. O investimento de curto prazo não morreu. Ele serve para uma parcela da população e também para uma parcela do patrimônio: a reserva de emergência.
Você propôs uma simulação em que o sujeito guarda 25% do salário todo mês. Depois de 20 anos, ele obtém um rendimento anual igual ao valor do salário anual, e “deixa de ser escravo do trabalho para ser o que quiser”. Mas a premissa desse modelo é obter rentabilidade de 10% ao ano. Dá para continuar sonhando com esse plano, em meio a uma taxa básica de juros de apenas 2% ao ano?
Sim. Entender isso muda a vida de uma pessoa. Esses 10% ao ano são uma média do retorno de toda a carteira. Hoje não há um produto único que entregue isso. No entanto, uma carteira de ações ou índice Ibovespa tem condições de dar isso, na média. Vai ter ano de +30%, ano de -20%, ano de +50%, ano de -20%… Mas, no geral, ao longo de muitos anos, essa é uma média bem realista e bem possível.
De onde eu tirei isso? A média de retorno do Ibovespa nos últimos 50 anos é o dólar mais 11% ao ano. Uma boa carteira de ações entregaria até mais, mas não quis colocar um cenário otimista, fui pé no chão. É um cenário de 10% ao ano, mas com bastante volatilidade. Haja eleição no caminho! [risos]
Em sua entrevista anterior para o E-Investidor, no fim de março, fase de pânico da pandemia, você disse que “essa era uma guerra com começo, meio e fim”. O fim já está mais claro no seu horizonte? Qual é o seu cenário de pós-covid?
Nós já passamos do meio e temos um cheiro do fim. Quando dei a outra entrevista, o pior ainda estava por vir, que foi abril, o fundo do poço dos resultados das empresas. Mas maio foi melhor que abril, junho foi melhor que maio, e julho foi bem melhor que junho, pelo que já sabemos. Agosto está se desenvolvendo bem.
O cheiro do fim é uma mistura de continuidade da recuperação dos resultados financeiros com alguma vacina. Daqui a pouco ela chega, seja de Oxford, da Rússia ou da China. É difícil dar estimativas, mas acho que no fim do ano já estaremos terminando isso. Esse será o nosso presentão de Natal: o fim da pandemia.
Outra frase de sua autoria: “O mercado é uma peixaria, então veja qual é a vieira que está sendo vendida por preço de sardinha e aproveite”. Por favor, conte para o nosso leitor: qual é a vieira do dia?
Eu continuo achando, há cinco anos, que a vieira com preço de sardinha é o Magazine Luiza. Não posso achar diferente porque é a maior posição do nosso fundo.
Tem algumas vieiras, sim. Dá pra fazer um pratão japonês: Magazine Luiza, Cogna e Rumo, são empresas que gostamos muito. Cada uma com uma história muito diferente, momentos diferentes e retornos diferentes. Mas são ativos que consideramos baratos.
FONTE: Estadão | E-Investidor