Salim Mattar afirma que o Brasil será mais privado

Para o homem das privatizações do governo, seria possível vender todas as 134 estatais até 2022

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secretário de desestatização e desinvestimento do Ministério da EconomiaJosé Salim Mattar Júnior, criou o hábito de meditar todos os dias nos últimos tempos. Mas, neste ano, a prática ganhou ares de obrigação. Isso porque ele deixou de lado a presidência do conselho de administração da Localiza, maior empresa de locação de veículos da América Latina, para trabalhar pela primeira vez no setor público e ser o principal responsável pelas privatizações do governo de Jair Bolsonaro.

Mattar ainda não se acostumou à conhecida lentidão do Estado, mas mesmo assim acredita que seja possível chegar próximo da meta de 1 trilhão de reais em privatizações criada pelo ministro da Economia, Paulo Guedes. “Ao deixarmos o governo em algum momento no futuro, o país será mais privado do que público”, afirma Mattar. Mas há desafios para a agenda de privatização: a crise global, a obtenção de apoio no Congresso e o engajamento político do presidente.

Qual a sua análise sobre o andamento das privatizações?

Salim Matar: Um pouco de cautela e caldo de galinha não fazem mal a ninguém. Tanto o presidente Jair Bolsonaro quanto o ministro Paulo Guedes vêm repetindo a importância de que o mercado tenha mais liberdade e que a competição seja mais saudável. O Estado tem de sair do mundo empresarial e focar o que é necessário, que é cuidar da qualidade de vida do cidadão. Não tem de produzir chip, vender combustível ou distribuir gás. Esse não é o papel do Estado.

Durante a campanha, o próprio ministro Guedes prometeu privatizações rápidas até para zerar o déficit público no primeiro ano. Os processos não estão lentos?

São mais de 130 estatais e algumas são mais fáceis de ser privatizadas, outras são discutíveis e algumas são mais difíceis. No primeiro semestre, nosso foco foi a reforma da Previdência. Mas, enquanto a reforma era tocada, fazíamos o planejamento com todo o cuidado. É necessário ser cuidadoso, pois estamos zelando pelo dinheiro do cidadão e também precisamos ter o melhor resultado possível de cada empresa. Aí é que se toma a decisão se determinada empresa precisa ser vendida, capitalizada ou passar por uma fusão.

Depois da reforma da Previdência, é possível dizer que as privatizações ganharão protagonismo?

O governo tem muitas agendas prioritárias, então é impossível dizer qual é a mais urgente. Claro que, no início, a reforma da Previdência era a prioridade. Hoje, há várias: reforma tributária, pacto federativo, entrada do Brasil na OCDE, além do acordo comercial entre Mercosul e União Europeia. A privatização também entra nisso. Precisamos de mais Brasil e de menos Brasília. Todas são prioritárias, mas é o tempo que vai dar a urgência de cada uma.

Porém, nenhuma das joias da coroa, como a Petrobras, entrou na conta. A intenção é privatizá-las?

Temos 17 ativos estatais à venda hoje e temos joias da coroa, sim. A Eletrobras não é uma? Ela pode se transformar em uma das maiores corporações brasileiras. É uma empresa espetacular, que teve problemas causados por administrações pouco eficazes, mas que tem um portfólio de produtos incrível em transmissão e geração de energia. O mercado ainda não percebeu isso. Os Correios são uma empresa de mais de 300 anos. Sua reputação ficou manchada pelo mensalão, mas pela idade e pelo serviço prestado tem de ser considerada uma joia.

As empresas deficitárias atraem a atenção dos investidores?

Existe uma demanda para todas as empresas que estão no PPI, o Programa de Parcerias de Investimentos, como Dataprev, Serpro, Telebras, Correios, Casa da Moeda e Lotex. Todas. Antes de divulgarmos as privatizações, tivemos o cuidado de ir ao mercado e verificamos que existem interessados nacionais e internacionais. E por quê? Esses ativos na mão do governo não são bem gerenciados. O governo, por sua própria natureza, não é um bom gestor de empresas. O mundo privado é muito ágil em comparação ao setor público, que é muito lento. A iniciativa privada toma risco sem tanta burocracia quanto o Estado, que tem um arcabouço legal a ser cumprido.

O mercado financeiro teme que uma crise política possa diminuir o apetite dos investidores por estatais. O senhor concorda?

Essa preocupação do mercado não procede. Na hora em que entramos no PPI, o conselho dá a permissão de privatizar as empresas. O presidente da República é o presidente do conselho do PPI. Ou seja, passou dali, acabou o risco político. O que existe é o risco global e também as oscilações do mercado. A crise entre os Estados Unidos e a China, por exemplo, fez as bolsas de valores do mundo inteiro responder. Isso é o mercado. Quem espera um mercado tranquilo e sereno não conhece como funciona.

Uma crise global é vista como inevitável por muitos economistas. Isso afetará as privatizações?

Está sobrando dinheiro no mundo. Atualmente, existem investidores com 1,5 trilhão de dólares procurando onde investir. E as melhores taxas de retorno estão nos países emergentes. O melhor país ocidental em desenvolvimento é o Brasil. Aqui falta infraestrutura e temos um estilo de vida ocidental, o que facilita para os investidores.

O ministro Paulo Guedes disse que quer privatizar todas as empresas da União. Isso é factível?

Temos o objetivo de vender todas as estatais. Existem algumas que os políticos e o próprio mercado acreditam que serão mais difíceis de privatizar. Mas a sociedade entende que o governo está fazendo o que havia prometido. E algo que sempre se fala é a questão dos empregos, mas os próprios números das privatizações mostram que é uma mentira. A Vale do Rio Doce tinha cerca de 17 000 colaboradores quando foi privatizada. Hoje, tem mais de 70 000. A Embraer saiu de aproximadamente 9 000 para 20 000. É uma falácia dizer que os empregos acabam com a privatização. A iniciativa privada é mais pujante.

A resistência do Congresso não pode ser um empecilho?

As privatizações serão mais fáceis de passar do que as reformas. Os parlamentares atuais estão muito mais sensatos. É só pegar a reforma da Previdência, que foi aprovada com mais de 370 votos. Ao deixarmos o governo em algum momento no futuro, o país será mais privado do que público. O sucesso do meu mandato em particular será o fechamento da minha secretaria.

O senhor acha que consegue cumprir essa meta até o fim deste governo?

Acredito que sim. E é claro que algumas empresas poderão continuar sendo públicas. O governo e a própria sociedade ditarão quais ativos serão mantidos. Mas o legado que vamos deixar é que elas serão administradas com a melhor governança possível. Um exemplo para nós é a Codelco, maior empresa de cobre chileno, que é uma estatal muito bem gerida.

O senhor teve dificuldade para se adaptar à atuação no setor público?

Faço meditação há muito tempo e isso ajuda. Sou um ente da iniciativa privada que está no governo. Aqui, as coisas são muito lentas. Precisamos reduzir este Estado obeso, que inferniza a vida do cidadão e do empresário.

Mas há empresas que se aproveitaram desse Estado generoso em benefício próprio. Como vê isso?

O capitalismo de compadrio está com os dias contados. O correto é fazer uma abertura gradual sem colocar em risco a indústria nacional. As tarifas de importação estão caindo e o Brasil começa a ter uma taxa de juro civilizada, assim como a inflação. Daqui a pouco vem uma reforma tributária e nossos impostos também ficarão mais civilizados. Esses empresários já perceberam isso e compreenderam que o tempo de compadrio acabou.

Como abrir a economia sem que haja uma quebradeira de empresas menos eficientes?

Não acredito que elas vão quebrar. O empresário é inteligente e sabe driblar situações. Assim como no passado já lidou com inflação e juros altos, a abertura do mercado será mais um momento difícil a ser enfrentado.

Fonte: Revista Exame

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