Shoppings conseguem reocupar 6 mil lojas fechadas na pandemia
Grandes grupos dizem que juro baixo incentiva busca de investidor por franquia
As operações dos shoppings centers em todo o país começam a dar sinais de uma recuperação mais consistente, depois das fortes perdas que o setor sofreu com a pandemia.
As vendas ainda estão abaixo do período pré-covid, mas essa queda, que chegou a 90% em março, ficou em 26,5% no fim de setembro. Segundo estimativas da Associação Brasileira de Shopping Centers (Abrasce) cerca de 6 mil lojas, das 11 mil que encerraram as atividades definitivamente entre abril e agosto, já foram reocupadas.
Essa recuperação de pontos comerciais reflete os patamares mais baixos dos juros básicos, que impulsionaram o interesse das grandes varejistas em ampliarem suas redes e, também, de investidores em franquias em ocupar alguns desses espaços.
“As âncoras [as grandes redes] estão disputando os espaços disponíveis e isso é um sinal muito bom de recuperação. Mas também estamos vendo novos investidores. Não são necessariamente novas marcas, mas gente que aproveita os juros baixos para investir em franquia”, afirma Felipe Andrade, diretor comercial da Aliansce Sonae, maior grupo de shoppings centers do país, com 39 empreendimentos. Andrade conta que, desde agosto, tem mais de 80 novos contratos em processo de assinatura.
O movimento também foi observado pela brMalls, com 31 empreendimentos no país. “Com juros mais baixos e os índices de desemprego mais altos, o varejo surge como uma opção para quem pegou uma indenização, por exemplo”, diz a diretora comercial do grupo, Jini Nogueira. Segundo ela, as substituições dos pontos têm sido “bastante dinâmicas”: as propostas comerciais tiveram acréscimo de 28% nos últimos meses ante o período pré-pandemia e 120 novas operações tiveram contratos assinados recentemente.
A Associação Brasileira de Franchising (ABF) não tem números de abertura de franquias em shoppings, mas diz que o setor vem em trajetória de recuperação mês a mês no faturamento e na abertura de novas unidades. “Temos notícia também de negociações, caso a caso, entre administradoras de shoppings e redes de franquias que são atraídas por condições diferenciadas. Este é um movimento mais recente e que vamos acompanhar até o fim do ano”, diz o presidente da ABF, André Friedheim.
“Há uma tendência de retomada das vendas e de abertura de lojas. Trabalhamos bastante para a taxa de vacância não crescer muito e acreditamos que teremos uma recuperação mais forte em 2021”, afirma Glauco Humai, presidente da Abrasce.
O índice de vacância nos shopping centers passou de 4,5% a 5% no pré-pandemia para 8,5% a 9% agora. A perspectiva da associação é de que essa taxa termine o ano em 7%, impulsionada pela procura mais intensa de varejistas nos últimos meses por causa da Black Friday e do Natal.
Há outras duas tendências observados pela Cyrela Commercial Properties (CCP), que é dona de shoppings em São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Goiás. A primeiro é a busca de espaços físicos por varejistas que eram puramente on-line e o segundo, de marcas de outros Estados de olho em espaços em São Paulo.
“Os varejistas que entraram na pandemia capitalizados ou que se capitalizaram nesse período estão acelerando seus planos de expansão”, diz o presidente da CCP, Pedro Daltro. Ele explica que o interesse das nativas digitais cresceu porque o envio de mercadorias usando as lojas como base tem reportado margens muito maiores do que o envio direto dos centros de distribuição.
Já a Multiplan diz que a volta das operações vem também com a atualização do mix de lojas dos shoppings de acordo com as novas demandas dos clientes. O vice-presidente institucional, Vander Giordano, conta, por exemplo, que o ParkShoppingBarigüi, em Curitiba, teve abertura de 16 operações, entre elas a chegada da joalheria Monte Carlo ao Sul do país.
Mas as empresas argumentam que a recuperação do setor seria mais rápida se o horário de funcionamento fosse estendido no Estado de São Paulo, maior mercado de shopping centers do país. De acordo com cálculos da Abrasce, o setor como um todo perdeu R$ 59 bilhões entre março e setembro, com as medidas de isolamento social.
Hoje, os shoppings paulistas, que correspondem a um terço do total dos empreendimentos brasileiros, podem funcionar por oito horas. Humai, da Abrasce, diz que cidades onde o funcionamento por 12 horas está autorizado já registram rentabilidade próxima à pré-pandemia. “Se São Paulo ampliar para 12 horas o cenário muda, porque se gera mais empregos, já que passam a ser dois turnos de trabalho. E também permite mais vendas e menos concentração de clientes.”
Tanto a Aliansce Sonae quanto a brMalls, que reúnem os maiores portfólios de shopping centers, afirmam observar melhores resultados recentes no Norte e Nordeste, onde a maior parte das capitais já está com horário mais amplo de funcionamento e alguns serviços, como cinemas, já voltaram a operar. “Há uma correlação totalmente ligada à jornada e às restrições. Alguns shoppings dessas regiões já estão com desempenho até melhor do que o do ano passado”, conta Jini, da brMalls.
Essa dinâmica também foi percebida por Tiago Lima, presidente da Saphyr Shopping Centers, que tem unidades no Rio e em São Paulo e em municípios do Norte e Nordeste. “As regiões Norte e Nordeste encontram-se em patamares mais avançados de retomada econômica e o Sudeste vem recuperando a normalidade mais rapidamente no último mês.”
Já o presidente da CCP observa que os consumidores que voltam a frequentar os shoppings estão gastando mais por visita do que no período pré-pandemia. Segundo ele, se não fossem as restrições e redução de duas horas na operação de alguns empreendimentos, a empresa poderia “começar 2021 com números próximos aos do início de 2020”.
Embora os descontos oferecidos em aluguel e condomínio no início da pandemia já tenham se reduzido, todas as companhias afirmaram manter negociações caso a caso – de acordo com a localidade do shopping, o segmento do varejo e o histórico de vendas dos últimos meses. Agora, no horizonte das administradoras estão os impactos do cenário macroeconômico, com o índice de desemprego crescendo e a renda das famílias mais pressionada por alta de preços e a redução dos auxílios governamentais.
“Superamos o principal momento de incerteza, quando tivemos reaberturas seguidas de novos fechamentos. Seguimos acompanhando o cenário macro relacionado à pandemia, como também aqueles relacionados às reformas que estão em votação no Brasil, que são decisivas para o país”, diz Giordano, da Multiplan.
FONTE: Valor Econômico | Por Raquel Brandão